Angelim verdadeiro, Angelim vermelho, Aracuy, Andira legalis Linneo, Andira anthelmintica Bentham, Lumbricidia legalis Vellozo, Família das leguminosas
História Natural. Árvore de cem ou mais palmos de comprimento, de três a seis e mais de grossura. Pison a descreve com o nome de Andira ibacariba, assim como Macgrave; o tronco é tortuoso, pardo esverdeado com raízes grossas, laterais, anguladas e horizontais; outras são copadas com copiosos e grandes ramos, seis folhas alternadas, terminadas por um ímpar, ovais, agudas na ponta, verdes escuras e lustrosas na parte superior e, na inferior, claras e sem lustro, guarnecidas de um pecíolo carnudo com a sua nervura longitudinal. As flores nascem entre os galhos e pelos ramos em lindos cachos, tendo cada uma seu pedículo verde; o cálice é de uma só peça parda, dividido no seu limbo em cinco pequenas partes agudas; a corola coriofila tem cor de lacre em pingo, é composta de cinco pétalos desiguais, o superior largo e marginado, no meio branco e rodeado; os dois laterais longos e obtusos, e os inferiores obtusos. Os estames estão reunidos a uma vagina na parte inferior da inserção dos pétalos e são curtas as porções dos filetes que as rodeiam. As anteras são curtas e pardas; o pistilo é pregado na parte inferior da vagina na inserção dos pétalos, recurvados e formados de dois estilos curvos, voltados um para o outro e a parte média tem cor de zarcão, coberto de uma penugem branca, terminado por um estigma pardo obtuso. O ovário é uma cápsula de forma oval, verde na parte de fora, preto quando fica seco; no interior é branco, sendo verde, e arroxeado quando seco. Contém uma noz que, antes de quebrada, é lanhada, esbranquiçada e, quando partida, fica branca, de sabor amargoso ingrato, adstringente (ver Balthazar da Silva Lisboa, p.206, t.19). O fruto do Angelim amargoso é ovóido, acaba com uma ponta na extremidade superior ou bem nas duas extremidades; acha-se marcado por duas suturas pouco salientes e não deiscentes; é longo, tendo de 4 a 5 centímetros, largo de 2 a 3, coberto de um epicarpo denegrido, que se torna enrugado quando seco. Debaixo do epicarpo, se acha um mesocarpo lenhoso, amarelo-esverdeado que se torna depois denegrido e prende-se ao episperma. A amêndoa é livre na cavidade interior ovóida, pontuda na extremidade superior (ver Bentham).
Análise Química. Do âmago extrai-se um licor espirituoso, amargo, que embebeda; a casca fibrosa, tenaz, cor de ferrugem, deita um cheiro nauseabundo, tem o sabor do Alões, assevera Pison. A água dissolve a parte amargosa e extrai-se a resina com o álcool. O Sr. Stanislas Martin obteve dos pós do fruto, destilados com água, um hidrolato aromático que contém em suspensão uma pequena porção de óleos essenciais. A infusão aquosa precipita pelo ácido iódico. O mesmo farmacêutico consegue extrair um alcaloide derretível a 80º, que assemelha-se à goma guta, ao qual deu o nome de Angelina. (ver Journal des Connaissances Médicales, 1847).
Propriedades. O Dr. Vicente Gomes da Silva diz que o Angelim é o mais precioso dos vermífugos; o Dr. Hamel o receitava contra a solitária; Swartz o tinha por específico de mesma tonia. O Dr. Arruda o considera como o melhor remédio contra os vermes, se bem que, por vezes, não sendo administrado com cautela, causa vômitos e convulsões. O Dr. Arruda deu ao Angelim o nome de Skolemora pernambucensis, diz que na sua província existem três espécies, todas com igual propriedade medicinal, e com madeira de igual préstimo. No Brasil, costuma-se fazer uso dos pós das sementes. Em poucos lugares preferem as raízes, enquanto se despreza a casca que melhor se conserva e é mais amargosa do que a semente. Reputa-se o sumo do entrecasco e da raiz um poderoso antídoto contra o veneno das mordeduras das jararacas e outras serpentes. A madeira serve para naus, cadastes, coraes e cintas; dura muito segundo a opinião dos carpinteiros. A madeira do Angelim do Pará, que parece ser a Andira racemosa de Lamarck, é muito apreciada na construção naval e também no corte de raios e falcas. Existem variedades do Angelim no Mauapiri, nas cordilheiras que avizinham o Rio Negro e o Rio Branco. Pison prescrevia os pós de Angelim de meia até uma oitava. Vicente Gomes da Silva, convencido dos erros que cometia o povo ignorante acerca das doses arbitrárias de um tão poderoso agente medicinal, tem marcado no seu Ensaio de Matéria Médica o modo de administração cada parte do Angelim. Casca em substância. Reduzida a pós, deve ser dada, a princípio, em pequenas doses e aumentar-se até que o enfermo comece a nausear, principiando a dar a um adulto um escrópulo; a uma jovem, quinze grãos; a uma criança de dois, três ou quatro anos, seis, oito ou dez grãos e a uma criança de um ano para baixo, de meio grão até um. Administrada em substância, não mata tão prontamente os vermes como em cozimento. Cozimento do Angelim. Prepara-se este cozimento fazendo-se ferver, em duas libras de água, uma onça de casca de Angelim; ao tomar uma cor alambreada ou, segundo aconselha Donald Manso, até reduzir a oito onças. Costuma-se ajuntar a este cozimento uma onça de xarope ordinário ou açúcar. Dá-se desse cozimento quatro colheres de uma vez a um adulto; três a um jovem e uma colher a uma criança. Não se pode conservar o cozimento muito tempo porque fermenta.É mister mandá-lo reformar logo que se altera. Xarope de Angelim. Prepara-se este com uma porção do cozimento da casca de Angelim e a dose de açúcar. A dose deve ser a mesma do cozimento. Pode-se dar este xarope com muito mais segurança e há quem o prefira a todas às demais preparações. Extrato de Angelim. Prepara-se o extrato fazendo evaporar o cozimento em banho-maria. Dois ou três grãos destes são suficientes para um adulto. Como este extrato é de uma ação muito veemente, a ponto de cinco grãos serem capazes de afetar um homem robusto, não se deverá recorrer a ele senão quando tiverem faltado todas as outras preparações. E porque este remédio deixa ordinariamente nos intestinos vermes mortos ou amortecidos, para lançá-los fora, costuma-se dar dose de Calomilanos e de Jalapa, ou melhor, uma dose de óleo de rícino. Este medicamento costuma muitas vezes, por uma má administração, atacar o enfermo pela sua ação narcótica. Logo que isto acontecer, deve-se dar ao enfermo uma limonada bem saturada de sumo de limão azedo e depois um purgante de óleo de rícino. A limonada deve ser quente, porque fria prejudica o enfermo que faz uso do Angelim.