História Natural. O Coca é árvore pequena, de seis pés de altura, com folhas de um verde belo e cachos de flores brancas. Suas frutas são pequenos bagos escarlates. Oriundo do Peru, o Coca parece ter sido encontrado nas alturas das serras do norte do Brasil. Em Minas, o Sr. A. St'Hilaire tem achado outra espécie de Erythoxilon: o Erythoxilon suberosum, cuja casca dá uma tinta ruiva. Faz-se a colheita das folhas quando se acham maduras e quase caem. A colheita é obra de cuidado e não se devem prejudicar os jovens ramos. Depois de apanhadas, as folhas são colocadas ao sol sobre uma coberta de lã e é preciso cuidado no ato da dissecação para evitar qualquer umidade. O Coca, uma vez seco, é fechado em sacos de pano cobertos de areia, os quais devem ser afastados do contato ou de lugares úmidos.
Propriedades. Segundo o que diz o Martius na sua Matéria Médica, p.62, os pós das folhas secas do Coca produzem sobre o sistema nervoso e sobre o cérebro um torpor evidente. Já o Dr. Unanue, em uma dissertação publicada em Lima, no ano de 1794, elogiou as virtudes da famosa planta do Peru, chamada Coca. Outrora, a planta foi objeto de mistério sagrado para os índios. Don Pedro Nolasco Crespo escreveu, em 1793, tratando sobre o Coca e apontou a planta como um excelente meio de diminuir a fadiga e o escorbuto dos marinheiros. Um jesuíta, Don Antonio Julian, o quis introduzir na Europa com o nome de Perla de América. Recentemente, o Dr. Von Tschudi escreveu uma memória acerca dos efeitos do Coca. Os índios mastigam o Coca, tomando na boca algumas folhas secas até lhes dar a forma de uma bola pequena, depois atravessam a bola com uma agulha de pau coberta de cal fina. A cal produz imediatamente sobre a mucosa da boca uma secreção de saliva que corre com abundância. Parte da saliva é engolida, parte é expelida. O sabor do Coca é bastante agradável, ligeiramente amargo e aromático, um pouco semelhante ao sabor do chá verde, de qualidade inferior. Todas as pessoas que costumam mascar o Coca apresentam faces pálidas, gengivas e lábios descorados, dentes esverdeados e alterados, com marcas denegridas nos ângulos da boca. Os que fazem uso imoderado do Coca se reconhecem logo pela palidez da pele, os olhos esmorecidos, os lábios trêmulos, o sistema muscular em completo estado de apatia. Os índios costumam tomar o Coca três vezes por dia e depois fumam cigarro para tirar o gosto. Os europeus também tomam o mesmo hábito misturando com as folhas do Coca, cal ou cinzas do Chenopodium quinoa, ou açúcar em pó. A ação do Coca assemelha-se à dos narcóticos administrados em pequena dose, porém os efeitos são mais iguais aos do Datura estramonium que ao do ópio. Sob influência do Coca, o olho ganha uma extrema sensibilidade à ação da luz; a pupila dilata-se notavelmente. O Coca, porém, tomado com excesso não causa suspensão das faculdades intelectuais, nem produz o sono, pois ele, como o ópio, excita o cérebro e é só a excitação repetida que afinal determina o torpor e perturba a inteligência. O efeito mais destacado é de operar nos que costumam usar as folhas de Coca com uma absoluta indiferença para os alimentos, podendo os que o tornam privar-se de uma alimentação copiosa, e todavia, desempenhar facilmente trabalhos seguidos e duros. O Dr. Von Tschudi cita o caso de um índio, que durante cinco dias e cinco noites não ingeriu alimentos, mastigando unicamente folhas de Coca, de duas em duas horas, meia onça cada vez e que dormiu só três horas, apesar de ter a idade de sessenta e alguns anos. Dizem e asseveram os índios que o Coca é remédio valioso para poder respirar na ocasião de se subir os elevados montes das cordilheiras, e o Dr. Von Tschudi verificou a asserção pela sua própria e repetida prática. Já muitos anos antes, o viajante Mr. de La Condamine havia observado o mesmo entre os índios Otomaques do Alto Maranhão que aspiram pelo nariz os pós de Curupa (Acacia nipó) (ver Humboldt, Voyage aux régions equinoxiales, t.8, p.314)